"Mensário de Arte", é composto e Impresso na Tipografia de A Tribuna, no Porto. A revista abre sempre com um poema inédito, manuscrito, à semelhança do que acontece em Folhas de Arte (1924). No nº1 o poema é de António Feijó ("Árvores Secas"), enviado por um familiar Coronel Júlio Feijó e no nº2 o poema é "Exílio", de Júlio Brandão.
Sendo director, Celestino Gomes é presença assídua como autor em todos os números, um princípio muito comum neste tipo de revistas. Já o Visconde de Villa-Moura (Bento de Oliveira Cardoso e Castro Guedes de Carvalho Lobo) é outro colaborador muito assíduo desta revista, sendo o poeta que abre, com manuscrito, o número 3. Uma passagem do seu poema inédito diz bastante sobre o intuito deste mensário de arte: "A mais bela manifestação da vida é a Arte. A mais bela das artes é a escultura. O maior dos escultores é o tempo. A obra mais belamente escultura do nosso tempo é a desgraça."
Precisamente, no segundo número, Aarão de Lacerda tem um longo artigo sobre o escultor Diogo de Macedo, seguido de extra-texto com um busto da sua autoria - um artigo que continua para o número seguinte. Talvez pelo interesse do artigo valha a pena demorar aqui um pouco. Lacerda apressa-se a dizer que ele seria um continuador natural de Soares dos Reis. Depois de uma breve biografia, o escritor relata a forma como o conheceu e o que viu no seu atelier. O que interessa fundamentalmente neste artigo é toda a força que Lacerda imprime em apostar na carreira futuro, que hoje sabemos, seria fulgurante, do escultor português. É o que diz aqui: "Diogo está novo: tem, parece-me, trinta e um anos. A sua vida como artista ainda é breve, havendo diante de si muito tempo para criar a esculpir os seus mármores."
Este é um Mensário de Arte, e a arte parece efectivamente estar bastante disseminada no conteúdo. Aqui, é de realçar o papel do gráfico João Carlos (1899-1960), que assina múltiplas vinhetas da revista, nomeadamente os incipit de letra inicial. Trata-se de um ilustrador novo e cuja carreira se inicia nos anos 20 com a ilustração de livros de alguns destes elementos da revista (Celestino Gomes, Thibaldina Mota), nomeadamente António Pereira Cardoso, que caricatura num pertinente desenho no número 2. Outro contributo artístico de notar é precisamente a rubrica "Os Novos", onde esta e outras caricaturas de 'novos' autores, que depois se equilibra com extratextos de ilustres canónicos como António Carneiro (nº3).
De entre a colaboração literária variada (do malogrado poeta transmontano Carlos Cochofel, a Narciso de Azevedo, passando por colaboração galega de Euxénio Carré Alvallelos), vale a pena destacar um soneto de Hernâni Cidade no nº3 (um soneto com enfoque na cavalaria medieval, numa linguagem de gramática simbolista), datado da altura em que Cidade já era professor na Faculdade de Letras do Porto, depois de fazer parte do corpo expedicionário na primeira guerra mundial.
No número final (4) de fevereiro de 1922, onde João Penha é o poeta com direito a manuscrito ("A um poeta d'agua doce"), há uma interessante tradução de António Ferreira (1885-1963), de um poema de Alfredo de Musset, "Jamais" (1939). Ainda nesse número final, destaque para um apontamento luso-hebreu: colaboração do Capitão Barros Basto (1887-1961), assinando com o seu nome hebraico Abraham Ben-Rosh, um conto, em quatro partes, devotado ao "Shabbath", seu título. Adicionalmente, temos a indicação que esse conto estará incluído no 'livro em preparação' Sepharadim (os luso-hebreus), que acabou por nunca ser publicado. É uma presença surpreendente num mensário de arte nortenho que durou apenas 4 números.
Ricardo Marques